Por José Simões
A questão agora é a seguinte: oitenta e três projetos (83) foram inscritos na LINC 2019. Desse total de inscritos sessenta e três (63) foram desclassificados (impugnados), em virtude de falta de documentação, e não irão ser avaliados artisticamente.
O principal motivo para a impugnação da maioria dos projetos inscritos estava relacionado ao item 1.10 VII (previsto no edital).
1.10 VII – prever a contratação de responsável técnico da área contábil com registro em seu respectivo conselho de classe – CRC e certificado de regularidade, que deverá realizar e assinar prestação de contas.
Em curtas palavras: o projeto artístico e cultural não foi considerado porque não se previu no projeto um contator.
De fato, soa estranha esta situação num edital voltado ao fomento da arte e da cultura. Chega a ser difícil de acreditar que a falta da previsão de um contador tenha sido o motivo inicial de impugnação de um projeto, não a qualidade, nem a relevância ou propriedade artística.
Podemos nos perguntar: qual a relação do profissional contador com o projeto ou execução artística ou cultural? A resposta é: nenhuma.
Mas e agora?
É importante destacar, por outro lado, que o edital era de conhecimento público. A leitura minuciosa pelos proponentes é condição para a participação. Não há informação na mídia (ao menos) de alguém que tenha buscado criticar este ou aquele ponto desse edital, antes do resultado. Houve até mesmo oficinas de formação oferecidas pela secretaria. Qual teria sido a participação?
A regra/edital, portanto, estava lá e para todos. Resta, portanto, ao poder público cumprir o edital. Além disso tivemos vinte grupos (20) que cumpriram todos os quesitos do edital.
É importante ressaltar que, ainda, existe a possibilidade do recurso para os grupos que se consideram penalizados na questão.
Do ponto de vista legal a secretaria cumpre o combinado.
Certamente teremos muitos desdobramentos e questionamentos diante desta situação.
Fica evidente que há algo errado nesse processo. Não me refiro ao edital e, sim, no modo como é pensada a LINC.
O equívoco está no antes. O agora é consequência.
Eu me pergunto, por exemplo, por que não alteraram a sequência do edital? por que não realizaram em primeiro lugar a avaliação artística de todos os inscritos? Depois da discussão da alocação das verbas pela comissão, seriam chamados os primeiros colocados para apresentar os documentos que são importantes para a gestão e lisura dos recursos, quando se trata de dinheiro público.
É preciso colocar a discussão artística e cultural em relevo no edital. Isso porque é difícil para o artista (escritor/a, bailarino/a, ator, atriz, músico/a, arte educador/a, etc.) pensar, estudar, organizar, discutir, escrever e reunir pessoas para desenvolver um projeto artístico ou cultural e receber a notícia que o seu projeto nem será lido. Dá para imaginar a frustação? A sensação de desvalorização. A vontade de chutar o balde?
Os projetos não caem do céu. Os projetos artísticos e culturais não nascem do nada. É muito suor para a produção. São horas e horas, entre idas e vindas, para se chegar a esta escrita. Um trabalho quase invisível.
O que se impõe (e esta situação nos alerta) é repensarmos o modo de incentivarmos e fomentarmos a Cultura e as Artes do município como um todo.
É urgente implementarmos mudanças nas políticas públicas culturais e artísticas que considerem as inúmeras dinâmicas de ação e funcionamento das Artes e da Cultura no município. Caso contrário estaremos, no ano que vem, discutindo outra vez a LINC.
Jose Simões é professor, encenador e pesquisador na área da Educação, do Espaço Teatral e Teatro-Educação.