Talita Fernandes, Folhapress
O vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) afirmou nesta quarta-feira (25) que o posicionamento do governo é único para o combate do novo coronavírus e defendeu o isolamento e distanciamento social.
Sobre o pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em rede nacional no dia anterior, Mourão disse que talvez ele não tenha se expressado da melhor forma.
"A posição do nosso governo por enquanto é uma só: isolamento e distanciamento social. Isso está sendo discutido e ontem o presidente buscou colocar e pode ser que ele tenha se expressado de uma forma, digamos assim, que não foi a melhor", disse.
Segundo Mourão, a intenção de Bolsonaro no pronunciamento era demonstrar a preocupação econômica. "O que ele buscou colocar é a preocupação que todos nós temos com a segunda onda como se chama nesta questão do coronavírus. Nós temos uma primeira onda, que é a saúde, e temos uma segunda onda, que é a questão econômica."
Na noite de terça (24), Bolsonaro fez um pronunciamento em rede social e voltou a falar em "histeria" sobre a pandemia. O presidente defendeu que escolas e comércio sejam reabertos e que isolamento seja imposto apenas a pessoas mais velhas ou que integrem o grupo de risco.
A fala do presidente foi bastante criticada por especialistas e a oposição. Ele se referiu ainda ao novo coronavírus como "gripezinha" ou "resfriadinho" e disse que se for contagiado não terá forte impacto em sua saúde por seu histórico de atleta, embora não haja respaldo científico para esta afirmação.
Mourão foi então questionado pela reportagem sobre a divergência entre o discurso do presidente, que defende isolamento apenas de pessoas mais velhas e mais vulneráveis, e da orientação do Ministério da Saúde e da OMS (Organização Mundial da Saúde), que falam em distanciamento social para todos os cidadãos.
"Existe uma discussão no mundo entre o isolamento horizontal e o isolamento vertical que são pessoas que pertence ao grupo de risco e as que têm convívio com elas. A minha visão por enquanto é que temos que terminar esse período que estamos em isolamento para que haja calibragem da forma como está avançando a epidemia no país e, a partir daí, se possa gradativamente ir liberando as pessoas dentro de atividades essenciais para que a vida vegetativa do país prossiga."
Apesar da divergência entre o que Bolsonaro tem falado e as orientações do Ministério da Saúde, Mourão disse que o presidente está, por enquanto, dentro da política traçada pelo ministro Henrique Mandetta (Saúde).
"Ele tem essa preocupação enorme com o verdadeiro desmantelamento da economia e em consequência das pessoas que vivem nas áreas mais pobres do nosso país da noite para o dia, mesmo que o governo coloque R$ 100, R$ 200, R$ 300 na mão dessa pessoa ela chegar ao supermercado e não ter o que comprar porque não está sendo produzido nada", disse.
Em meio às críticas a Bolsonaro sobre minimizar a importância de isolamento, o vice-presidente disse que a posição do governo continua a mesma: "estamos mantendo o isolamento e o distanciamento social."
Mourão afirmou ainda que amanhã o chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, vai conduzir uma reunião nesta quinta-feira (26) com representantes dos ministérios e dos governos dos estados para definir um planejamento comum sobre questões logísticas no país.
O governo federal e os estados têm divergido sobre medidas de restrição de circulação. Bolsonaro fez críticas à ação dos chefes do Executivo estaduais e disse que há uma histeria e exagero na paralisação de serviços.
O vice-presidente minimizou a divergência entre a União e os estados, a fala ocorre apesar do clima de tensão entre Bolsonaro, Doria e os governadores do Sudeste durante reunião por videoconferência nesta quarta.
"Essa questão entre governadores e o presidente da república faz parte da política. A política muitas vezes nos coloca em polos opostos, mas a minha visão é muito clara. Existe hoje um ambiente de cooperação entre os governos estaduais e o governo federal, porque temos que estar unidos o tempo todo na busca da solução de como vencer essa epidemia com o menor dano possível a nossa população", disse.
A entrevista foi concedida por Mourão por meio de uma videoconferência na tarde desta quarta, após a primeira reunião do Conselho Nacional da Amazônia Legal. O órgão é presidido por ele e integrado por representantes de 14 ministérios.
A assessoria de imprensa da Vice-Presidência comunicou jornalistas na terça-feira sobre a realização de uma coletiva presencial na tarde desta quarta. Embora a entrevista estivesse prevista para 15h30, só teve início às 17h00.
Ao chegarem ao local, os repórteres foram colocados em uma sala e informados que a conversa seria feita por meio de uma videoconferência com o vice-presidente. Embora Mourão estivesse no mesmo prédio, permaneceu em outra sala.
O vice-presidente falou ainda sobre as preocupações do governo com o avanço do novo coronavírus na região Amazônica. Ele disse que foram colocados postos de fiscalização nas fronteiras. O governo brasileiro restringiu o acesso por via terrestre a estrangeiros nas nove fronteiras com países da América Latina.
Mourão disse que a população ribeirinha, no interior da Amazônia, já está protegida por viver mais isolada, mas que estão sendo realizadas conversas com a Marinha para controle dos barcos que navegam nos rios da região.
O vice-presidente disse ainda que vai trabalhar para o desbloqueio de recursos do Fundo Amazônia.
A Noruega anunciou em agosto de 2019 a suspensão de cerca de R$ 133 milhões do fundo, dias depois de o governo alemão também ter anunciado bloqueio de parte de seus recursos. Ambos justificaram o aumento do desmatamento no Brasil para o corte.
"Precisamos de financiamento em um momento onde grande parte dos recursos do Estado brasileiro estão voltados para a região mais populosa. Então essa busca do financiamento para destravar o fundo que ficou travado no ano passado. Vamos avançar no diálogo com os governos da Alemanha e da Noruega e reativação plena do Fundo Amazônia para que a gente possa ter acesso pleno a esses recursos", disse Mourão.
O pensamento do vice é divergente de Bolsonaro, que costuma dizer que países europeus não devem interferir na preservação da floresta amazônica.