A Comissão da Mulher Advogada da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), em Sorocaba, publicou, na manhã desta quinta-feira (5), uma manifestação de repúdio e indignação quanto ao julgamento envolvendo o caso de estupro cujo a vítima é a influenciadora digital Mariana Ferrer, em Santa Catarina.
O caso ganhou repercussão nesta semana por causa da sentença dada ao réu, o empresário André Aranha, de "estupro culposo"- não tipificado no código de processo penal - o qual o juiz deu entendimento de que o abuso sexual foi praticado de maneira "não intencional". Tal condenação fez com que Aranha fosse absolvido.
Na nota, a Comissão, juntamente com o Comitê de Enfrentamento da Violência à Mulher, foca em abordar a perspectiva de gênero, a qual considera não ter sido respeitada durante a análise do processo. "Expôs Mariana Ferrer à intensa revitimização processual, intensa violência institucional e ao machismo estrutural, evidenciando a cultura patriarcal enraizada na sociedade", critica.
Em outro trecho, a manifestação conjunta repudia a forma como foi conduzido o processo criminal, com alegada e "suposta tecnicidade" e reclama também do tratamento que Mariana recebeu do juiz do caso, Rudson Marcos, e do advogado de Aranha, Cláudio Gastão da Rosa Filho, cujo vídeo da audiência, viralizado nas redes sociais nesta semana, evidencia a humilhação sofrida pela influenciadora. "Não há técnica quando a vítima é exposta daquela forma [...]. Não há técnica quando a vítima se torna o foco de persecução penal [...]. Não há técnica quando a mulher é revitimizada em audiência [...], não há técnica quando a sociedade minimiza o perfil do agressor [...]. Não há técnica quando lhe falta decoro [...]. Não há técnica quando falta humanidade".
Em certo momento da gravação da audiência, Mariana, ao ouvir diversas provocações do advogado de Aranha, pede, chorando, ao juiz: "excelentíssimo, eu estou implorando por respeito".
O texto ainda cita que a comissão "acompanhou com profunda indignação as notícias veiculadas sobre o processo criminal de André Aranha (réu acusado de cometer o estupro e que foi absolvido pelo juiz após a sentença de ´estupro culposo´)".
"Esperamos que essa repercussão faça com que os tribunais e as instituições jurídicas iniciem um intenso processo de capacitação para que cesse qualquer tipo de violência institucional contra mulheres", continua a nota.
Entenda
O julgamento do caso de estupro da influenciadora digital, Mariana Ferrer, se tornou emblemático. As imagens da sessão de julgamento que inocentou André de Camargo Aranha da acusação de estupro de vulnerável contém, para ativistas e advogados, uma série de erros que tornam Mariana Ferrer vítima de mais violências.
As informações são da Agência Brasil.
O advogado Marcelo Valho, especialista em direito de vulneráveis, destaca, por exemplo, a falta de intervenção do juiz e do promotor durante a fala do advogado de defesa do acusado, que acabou humilhando a vítima.
Por esta atuação, a conduta do juiz Rudson Marcos, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC), está sendo analisada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que abriu um procedimento administrativo.
O advogado do acusado, Cláudio Gastão da Rosa Filho, também deve prestar os esclarecimentos preliminares à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Santa Catarina.
A Procuradoria da Mulher do Senado Federal apresentou ainda um pedido para que Ministério Público anule a sentença.
Para a advogada doutora em Direito, Estado e Constituição, Carolina Ferreira, durante o julgamento, Mariana Ferrer foi vítima da violência institucional do estado.
Ao inocentar André de Camargo Aranha, o juiz considerou que o acusado não teve a intenção de cometer estupro, levando ao questionamento e ampla repercussão nas redes sociais sobre a existência do termo "estupro culposo”, que não tem previsão nas normas brasileiras.
Organizações de Direitos humanos e outras instituições também se manifestaram. O Mee Too Brasil, movimento que busca dar visibilidade às denúncias de abuso sexual publicou nota em que destaca a importância da pressão social para a alteração desse resultado inicial.
O Ministério da Mulher da Família e dos Direitos Humanos também publicou nota em que repudia o considerado "estupro culposo" e ressalta a confiança na atuação das instâncias superiores.