Thaiza Pauluze Rogério Pagnan, FOLHAPRESS
O governo de Jair Bolsonaro divulgou nesta quarta (8) o texto do decreto assinado na terça (7) que flexibiliza as regras sobre o direito ao porte -transportar a arma consigo, fora de casa ou do local de trabalho- de armas e munições no país.
Entre as mudanças, novas categorias ficam autorizadas a transportar armas, como políticos com mandato e jornalistas da cobertura policial.
Adolescentes não precisam mais de autorização judicial para praticar tiro esportivo, e a quantidade de munição que pode ser comprada centuplicou.
Armas mais letais deixaram de ser de uso restrito das forças de segurança, como a .40 e a 9 mm –na prática, somente armas de calibre utilizado para caçar animais de grande porte ficam restritas.
Tais regras se somam àquelas sobre posse de armas –ter o armamento em casa ou no local de trabalho–, que foram flexibilizadas também em decreto em 15 de janeiro, numa das primeiras medidas de Bolsonaro após assumir o Palácio do Planalto.
O novo texto depende da publicação de portarias normativas e regulamentações do Exército e da Polícia Federal, mas a Câmara dos Deputados já disse que irá analisar sua constitucionalidade.
Segundo o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), se houver algum ponto do decreto que avance sobre prerrogativas de decisão do Legislativo, ele pode ser sustado. O PT e o PSOL já apresentaram decretos legislativos pedindo que o texto perca validade.
“Se a Câmara entender que há excesso, vamos questionar, como questionamos o outro no início da legislatura”, disse Maia, se referindo ao decreto que aumentava o número de servidores que poderiam decretar sigilo sobre documentos. O texto foi sustado pelo plenário, no primeiro recado enviado pelo Congresso a Bolsonaro neste ano.
Ao comentar o decreto, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, disse que ele não faz parte de uma estratégia de combate à criminalidade. “Não tem a ver com a segurança pública. Foi uma decisão tomada pelo presidente em atendimento ao resultado das eleições”, disse Moro.
Segundo a última pesquisa do Datafolha, de dezembro do ano passado, 61% da população é contrária à liberação da posse de arma no país, e 68% também são contra facilitar o acesso das pessoas a armamentos.
A diretora do Instituto Igarapé, Melina Risso, rebateu Moro. O decreto, para ela, “é de insegurança, de derramamento de sangue, especialmente num momento de polarização e intolerância”.
Para Risso, ao permitir o porte para “uma série de categorias que não dependem de arma e não têm treinamento adequado”, o texto vulnerabiliza esses profissionais e os torna alvos. “É o que já acontece com policiais; muitos são mortos quando estão fora de serviço, mas armados.”
Ainda facilita o acesso a armas pela criminalidade e o desvio de armamento, diz a diretora do Igarapé.
A possibilidade de calibres mais letais na mão de pessoas comuns, “fragiliza as forças de segurança pública e coloca os policiais em risco”. “É uma receita do fracasso.”
“É o maior retrocesso em relação ao tema que o país já viu”, resume Risso.
Na posição contrária, o coronel da reserva da PM Marcel Lacerda Soffner, especialista em segurança pública, diz considerar a medida positiva.
“Antes a criminalidade tinha certeza que se deparasse com um caminhoneiro ele estaria desarmado. A partir de hoje, passa a existir o princípio da dúvida”, afirma ele.
Presidente da Associação Brasileira da Pela Legítima Defesa e ex-comandante metropolitano da PM paulista, o Coronel Jairo Paes de Lira considera o texto um “avanço que devemos comemorar”, mas diz que ainda é pouco.
“Não é tudo que esperávamos do governo. Achamos que não deveria haver distinção de categorias, todo cidadão de bem deve ter direito a arma”, diz, referindo-se ao Estatuto do Desarmamento, de 2003, como “lei draconiana”.