Via Jornal da USP
Moradores de cidades com as menores taxas de suicídio localizadas no Estado de São Paulo (Registro e São José dos Campos) publicaram mais sobre o tema no Twitter mas, ao contrário do que se imaginava, a maioria das publicações não tinha conteúdo danoso, não expressava o comportamento suicida nem sofrimento. Os resultados fazem parte da tese de doutorado de Camila Corrêa Matias Pereira, defendida na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP. O estudo apresentou, ainda, dicas gerais de como se comunicar acerca do tema. A substituição de termos como “suicídio cometido” (que associa suicídio a crime), “tentativa de suicídio bem-sucedida” (que pode dar uma conotação positiva), “tentativa de acabar com a própria vida”, “tentativa não fatal de suicídio”, “suicídio consumado” por “morreu por suicídio” foi bastante recomendada.
O objetivo do trabalho foi analisar postagens na rede social Twitter sobre suicídio, investigar evidências científicas sobre recomendações e melhores práticas para a comunicação segura sobre o comportamento suicida no ambiente on-line, além de identificar barreiras e facilitadores da comunicação segura em produções discursivas e mensagens de apoio relacionados ao tema.
Na primeira parte do trabalho, Camila examinou 804 publicações feitas desde o início do Twitter, em 2006, até o período em que foi realizada a busca, em 21 de junho de 2018. As postagens eram provenientes de quatro cidades do Estado de São Paulo: Marília e Ribeirão Preto, que tiveram os maiores coeficientes de suicídio no período estudado (taxas superiores a 7,5 óbitos por 100 mil habitantes); e Registro e São José dos Campos, que apresentaram os menores números (inferiores a 5,5 óbitos por 100 mil habitantes). Os dados são da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dadaos (SEADE) de 2016.
No Estado de São Paulo, dados divulgados pela Secretaria de Estado da Saúde mostraram que, só em 2019, 2.365 pessoas morreram por suicídio, o equivale a uma taxa de 6,13 mortes por 100 mil habitantes.
A maioria das postagens consistia em tweets (84%) feitos por pessoas do sexo feminino (60%) em primeira pessoa (64%), não mencionava método para o suicídio (98%) nem comportamento suicida individual (72%).
Foi visto também que posts com conteúdo preventivo tiveram, aproximadamente, oito vezes mais chances de receberem curtidas quando comparados às postagens pró-suicidas (25% contra 12%, respectivamente). “Uma questão que nos chamou a atenção foi o fato de que pessoas que expressavam sofrimento e ideações suicidas publicavam mais postagens pró-suicidas e tinham pouco retorno para as necessidades que expressavam”, destaca Kelly Giacchero, professora da EERP e orientadora de Camila. “Esse achado mostra que buscar apoio nas redes sociais virtuais tem sido um meio pouco seguro para a pedir ajuda.”
Na segunda etapa, a pesquisadora fez uma revisão sistemática da literatura para investigar se evidências científicas respaldam recomendações e melhores práticas para a comunicação segura sobre comportamento suicida no ambiente on-line. Dos 429 artigos selecionados inicialmente, quatro foram incluídos no estudo após a aplicação de critérios de elegibilidade.
Camila identificou várias recomendações. Entre elas, o incentivo à busca de ajuda, o foco na prevenção, o estímulo à procura por apoio social, entre outras.
O uso de imagens clichê (como a de uma pessoa segurando a cabeça entre as mãos) também apareceu na literatura como algo a ser evitado. “Mas é importante frisar que as observações não estão apoiadas por dados empíricos, ou seja, são sugestões intuitivas”, ressalta Camila. “Apesar disso, vimos que a mudança poderia reduzir o estigma ou a percepção de um termo pejorativo.”