Alfredo Henrique, Artur Rodrigues e Tayguara Ribeiro, FOLHAPRESS
Moradores da periferia, em sua maioria negros, os mortos após a ação policial em Paraisópolis no domingo (1º) saíram de outros bairros da Grande São Paulo em busca de diversão no baile funk de rua mais famoso da capital.
Segundo familiares e conhecidos das vítimas, elas viviam em bairros sem oferta de lazer. Para ir ao local, alguns deixaram de avisar ou mentiram para os pais, que só descobriram que os filhos estavam a quilômetros de casa após as notícias sobre a tragédia.
Dos nove mortos, quatro eram adolescentes –e só uma era mulher. A reportagem conseguiu localizar parentes e conhecidos de seis deles.
*
Gustavo Xavier, 14
Mais novo entre as vítimas do pisoteamento, Gustavo foi um dos jovens que foi ao baile de Paraisópolis sem avisar os familiares. Era a terceira vez que fazia isso. "Vimos ele nas imagens que foram divulgadas, em que ele estava caído no chão. A gente queria ter esperança, mas já havia muito medo de que ele estivesse morto", disse o padrinho dele, Roberto Oliveira.
Gustavo morava com a avó e a mãe no Capão Redondo, no extremo sul da cidade. O rapaz fazia bicos em um mercado e sonhava em comprar um Gol modelo antigo.
Oliveira afirma que há muito preconceito de classe em relação a jovens pobres que, assim como Gustavo, buscam o lazer nesses bailes. Isso se reflete, diz ele, na forma como autoridades tratam o caso também. "Se fosse lá, como é mesmo?, Higienópolis, o tratamento seria diferente", diz.
Mateus dos Santos Costa, 23
O vendedor de produtos de limpeza Mateus dos Santos Costa morava em Carapicuíba (Grande São Paulo) e costumava ir a bailes funk em Paraisópolis de vez em quando. Mateus era solteiro, não tinha filhos e morava sozinho. Os pais dele moram na Bahia.
"Ele vendia produto de limpeza em caminhão e pagava o aluguel da casinha dele", afirma a doméstica Sílvia Ferreira Gonçalvez, 41, cunhada de Mateus.
"Ele só foi lá [ao baile funk] porque em Carapicuíba não tem opção. Nem a gente que é casal tem para onde ir", diz.
Bruno Gabriel dos Santos, 22
Bruno havia ido ao pancadão comemorar seu aniversário. Ele trabalhava como operador de telemarketing e vivia em Mogi das Cruzes. Segundo a irmã, a professora Vanine Cristiane Siqueiras, 39, Bruno fez 22 anos no dia 28, mas resolveu comemorar na noite de sábado (30). Segundo ela, Bruno foi adotado ainda pequeno.
"Ele pegou as coisinhas dele e falou que ia passar a noite com os amigos, comer uma pizza e para comemorar o aniversário", conta.
A professora também contesta a versão da polícia de que o jovem teria morrido pisoteado. Ela disse ter visto imagens dele caído no chão e seu corpo não apresentava sinais de pisoteamento.
Marcos Paulo de Oliveira dos Santos, 16
O estudante Marcos Paulo de Oliveira dos Santos, 16, morava no Jaraguá (zona norte) com a avó. No sábado (30) à noite o garoto disse a ela que ia a uma pizzaria com amigos da escola, que ficaria na redondeza de onde residia. E não voltou mais.
"Foi a primeira vez que ele foi nesse baile, segundo a gente sabe", afirmou uma parente, que pediu para não ter seu nome revelado.
Segundo ela, um primo de Marcos foi junto e também ficou machucado na confusão. "Um segurou na mão do outro, mas no meio do tumulto todo mundo dispersou e o Marcos Paulo acabou ficando sozinho", disse.
"O primo apanhou muito de cassetete e está muito machucado. Ele não viu quando o Marcos morreu, só o momento em que ele caiu no chão, não sabe o que aconteceu", afirmou.
Marcos estava no ensino médio e fazia curso técnico. O pai é separado da mãe e, desde pequeno, a avó cuida dele.
Denys Henrique Quirino da Silva, 16
O estudante Denys Henrique Quirino da Silva, 16, morava em Pirituba (zona norte) com a família. Ele estudava e trabalhava com limpeza de estofados e sofás. "Meu irmão não era um criminoso. Ele trabalhava, estudava e também gostava de funk. Quem morreu ali foi inocente. Não tinha 5.000 criminosos ali", disse Danylo Quirino, irmão de Denys.
A família contesta a versão de que o jovem tenha morrido pisoteado. Segundo eles, o corpo do jovem não tinha sinais de pisões, nem a roupa tinha marcas de sapatos.
Dennys Guilherme dos Santos Franco, 16
O estudante Dennys Guilherme dos Santos Franco, 16, morava com a família na Vila Formosa (zona leste de SP).
A irmã do rapaz deixou o IML (Instituto Médico Legal) reclamando que não pôde ver o corpo do irmão.
"Ele está muito machucado na cabeça. Capturaram ele de qualquer jeito. Ele estava com a barriga coberta, não me deixaram ver. Eu pedi para tocar ele, não me deixaram", disse Fernanda Santos. Segundo ela, os ferimentos aparentam ser de agressão. "Tem só um galinho [na cabeça], a mão dele está intacta, do joelho para baixo também. Isso não foi pisoteamento."
Fernanda ainda diz que os amigos tentaram socorrer Dennys, mas que policiais não permitiram. "Todo mundo sabe o que foi. Um menino negro, na favela, curtindo um baile. Ele caiu, um amigo foi socorrer e um policial falou "pode deixar que a gente cuida dele". Depois colocou ele [o amigo] para correr."
Outras vítimas
Também morreram no episódio Luara Victoria Oliveira, 18, Gabriel Rogério de Moraes, 20, e Eduardo da Silva, 21. A reportagem não localizou as famílias deles.