Igor Gielow, FOLHAPRESS
A nova configuração do cenário eleitoral para o pleito de 2022 obrigou os dois principais presidenciáveis do chamado centro no momento, o governador João Doria (PSDB-SP) e o apresentador Luciano Huck, a rever seus cálculos para o embate.
A mexida no tabuleiro decorre da volta de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à arena pública, após sua libertação na última sexta-feira (8), e do especulado antagonismo entre ele e Jair Bolsonaro.
Em ambos os casos, a aposta de estrategistas dos presidenciáveis é no cumprimento da profecia do embate sectário entre Lula e o presidente.
O motivo seria um certo fastio popular, aferido em pesquisas qualitativas, com o jogo político extremado que impera desde 2013 no país.
Isso abriria espaço para a pregação pela moderação, espremendo os partidários mais duros para os extremos –aqui nem cabe falar nos polos distantes tanto da direita ou da esquerda, mas em fidelidade ao líder, seja ele o petista ou o presidente.
Contra essa leitura, há o fato de que os movimentos iniciais de Bolsonaro e Lula foram de ataques mútuos, mas sem uma escalada em tempo real. A salva inicial de tiros foi relativamente contida, ainda que estejam sendo observados com atenção por grupos como os militares.
No mais, as situações do tucano e do apresentador da TV Globo no xadrez são diversas.
Aliados de Doria acreditam que o combate de baixo impacto entre os protagonistas federais não durará por muito tempo e tende inclusive a criar tensão social.
Assim, eles acham que o governador precisa estabelecer-se como um operador viável de políticas públicas e soluções que possam ser replicadas pelo país.
No discurso, o tucano já vinha operando uma ação para distanciar-se do candidato eleito em segundo turno na esteira do movimento BolsoDoria, que associou ambos os nomes em 2018.
Doria começou devagar, fez pregações por maior comedimento, mas a relação chegou a um ponto de ruptura, no qual foi chamado de "ejaculação precoce" pelo presidente.
Qual efeito disso sobre sua imagem é algo que está sob análise. Chamou a atenção em círculos tucanos uma pesquisa reservada feita nesta semana, que colocou o governador paulista como dono de maior rejeição entre várias lideranças nacionais.
Há outras variáveis que dificultam a vida do tucano. Apesar da associação ao dito centro, isso no Brasil significa ser de centro-direita. No caso de Doria, fortemente antipetista –tanto que suas manifestações sobre Lula fora da cadeia foram duras, como é usual.
Hoje, a maior liderança do antipetismo no país é o presidente, o que lhe garante uma fatia razoável do cerca de um terço do eleitorado que o apoia. Os bolsonaristas ideológicos, ditos radicais, estão, segundo cortes feitos pelo Datafolha, na casa dos 10%.
Doria vai tentar apelar ao grupo não tão fiel a Bolsonaro nessa faixa, mas precisa de armas diferentes para apresentar. Nessa linha, propagandeia tanto os bons números da segurança pública em São Paulo como um programa social para a área mais pobre do estado, o Vale do Ribeira.
Já o caso de Huck está em outro estágio agora, não menos pelo fato de ele não ter passado pelo escrutínio de uma campanha eleitoral ou governar um estado.
A pressão é outra: aliados estão ficando impacientes com a relutância do global, que já desistiu de uma candidatura presidencial no ano passado, em se assumir postulante.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), um de seus maiores incentivadores, têm se queixado a aliados de que a intensa movimentação do apresentador só tem mirado um público de convertidos.
Huck, em que pese diversas conversas institucionais, investe bastante energia em conversas com um estrato da sociedade civil que já lhe é simpático, em fóruns de endinheirados e investidores ou de classe média-alta.
Falta, na visão de FHC e de outros, explicar ao grande público ao qual Huck tem acesso como artista popular o que seria possível fazer para melhorar as condições de vida no país.
Recente artigo do economista e aliado Arminio Fraga na Folha de S.Paulo, acerca da redução de desigualdades, é visto como um mapa para essa retórica.
Apoiadores da candidatura Huck no DEM acreditam que o apresentador também precisa se mostrar pronto para a pancadaria política que o espera.
Como se vê, há políticos tucanos e figuras que orbitam o partido empenhadas não pelo governador de São Paulo, mas pelo global, o que inviabiliza a filiação de Huck ao PSDB. De resto, o partido de FHC amarga ter sido triturado nacionalmente em 2018.
Seja como for, no entorno de Huck a avaliação é a mesma apurada entre aliados de Doria acerca do debate da polarização Lula-Bolsonaro.
Só que o global poderia, acham aliados, mostrar-se como alternativa mais centrista do que o tucano, atraindo tanto para a centro-esquerda urbana como o eleitor de baixa renda de Bolsonaro. Como fazê-lo de uma forma popular, mas não populista, é a questão. Se ele for candidato, claro.