Erick Rodrigues
Quando 2019 chegar ao fim, também vai estar encerrada toda uma década, um período muito fértil no mundo das séries. Continuando a guinada do gênero, que já foi chamada de "era de ouro", os últimos dez anos vieram acompanhados de boas histórias que influenciaram e ainda vão influenciar novas produções.
Nesse período, também fomos mudando a forma de consumo desses produtos. Antes preso às programações dos canais de TV para assistir aos episódios das séries favoritas, o público descobriu que poderia consultar o catálogo de uma plataforma e acompanhar as produções que quisesse, no momento mais apropriado.
O streaming ganhou força e conquistou um público que já deixa de pagar pacotes de TV por assinatura para ter várias opções de serviços do gênero, que, diga-se de passagem, seguem aumentando. A Netflix, a empresa mais popular do ramo, continua sendo um modelo a ser batido e estimula a concorrência a se estabelecer nesse mercado cada dia mais competitivo.
Foram muitas as histórias contadas nas séries ao longo da última década. De dragões a aristocratas, de inteligências artificiais a clássicos personagens da literatura, de outras dimensões a futuros não tão distantes, tudo para os mais variados públicos.
Para fazer esse ranking, escolhi 14 produções que, na minha opinião, são as melhores do período entre 2010 e 2019. Decidi incluir na lista, também, algumas séries que, mesmo no ar desde a década passada, encerraram suas trajetórias nos últimos dez anos e, de alguma forma, fizeram a diferença. Vamos a elas:
14) Sherlock (BBC)
Inspirada nas histórias e personagens de Arthur Conan Doyle, "Sherlock" ajudou a construir a fama das produções britânicas nos últimos anos, sempre associadas a qualidade. Aqui, os ótimos Benedict Cumberbatch e Martin Freeman vivem a dupla de investigadores Sherlock Holmes e Watson, inserida nos dias de hoje, mas ainda com as mesmas características que conduziram a obra de Doyle pelos anos. Com um ritmo dinâmico e diálogos inspirados, marcados pela ironia do humor inglês, a série deu novas roupagens às histórias mais célebres do detetive, sempre assombrado pelo vilão Moriarty. Com quatro curtas temporadas, ainda é incerto se "Sherlock" vai ganhar novos episódios.
13) Stranger Things (Netflix)
Lançada em 2016, a série dos irmãos Matt e Ross Duffer já nasceu apelando para a nostalgia que vive no coração dos espectadores. Ambientada nos anos 80 e com uma trilha sonora que nos transporta para o período, "Stranger Things" reúne diversas referências da cultura pop para criar a história sobre o grupo de crianças que entra em contato com criaturas de uma outra dimensão. Com ares mais despretensiosos no início, a produção foi amadurecendo ao longo das temporadas já exibidas e sempre entregou um ótimo divertimento, mesmo pecando um pouco pela repetição. Rende ótimas maratonas de fim de semana.
12) The Marvelous Mrs. Maisel (Amazon)
Miriam Maisel vive na década de 50 e enfrenta, com coragem e bom humor, os desafios de um mundo machista, que encara como suficiente que uma mulher se dedique ao papel de esposa. Traída pelo marido, a protagonista volta com os filhos para a casa dos pais e mergulha no sonho de se transformar em uma comediante de stand-up. Para isso, enfrenta a resistência de contratantes, o julgamento dos pais e o preconceito dos colegas de profissão. "The Marvelous Mrs. Maisel" tem um elenco espetacular e um texto afiadíssimo e verborrágico. Os episódios, além de provocar risadas, também levantam questões importantes sobre o feminismo, que ainda precisam ser encaradas.
11) The Good Fight (CBS All Access)
Série derivada do drama jurídico "The Good Wife", "The Good Fight" é uma das séries que melhor dialoga com a realidade que estamos vivendo. Ao longo de três temporadas, a produção já se dedicou a discutir diversos temas relevantes, como radicalismo político, racismo, privacidade e equidade salarial. Vinda da série original, a advogada Diane Lockhart recomeça a vida profissional em um novo escritório jurídico e tendo que lidar com conspirações políticas, sabotagens e casos surpreendentes.Um prato cheio para quem gosta de reflexões e boas tramas de tribunal.
10) Westworld (HBO)
Complexa e instigante, "Westworld" dá vários nós na cabeça do espectador a cada temporada. Sem subestimar a inteligência do público, a série de ficção científica criou um quebra-cabeça muito prazeroso de ser resolvido. No início, a série introduz a história de um parque temático criado para satisfazer os desejos de clientes ricos e habitado por inteligências artificiais, para, depois, revelar que há segredos por trás dessa empreitada. Como se não bastasse, na segunda temporada, o espectador descobre que "Westworld" está sendo contada fora de uma ordem cronológica, o que exige ainda mais atenção para os acontecimentos.
9) Game of Thrones (HBO)
Afetada em cheio por uma última temporada irregular e cheia de problemas narrativos, "Game of Thrones" merece um espaço nessa lista. A série, baseada nos livros de George R.R. Martin, mobilizou espectadores do mundo todo com uma trama adulta, ainda que sustentada por histórias de dragões e criaturas estranhas. Ambição, inveja, truculência e poder estiveram no centro da disputa pelo trono de ferro de Westeros ao longo de oito temporadas. A produção ajudou a HBO, já bastante consolidada nesse mercado, a atingir um patamar ainda mais alto de qualidade, mesmo considerando a decepção causada pelos episódios finais.
8) Downton Abbey (ITV)
"Downton Abbey" parecia uma série que ficaria restrita a um determinado tipo de público, mas se transformou em um fenômeno mundial logo no primeiro ano, a ponto de ganhar uma sequência no cinema. A história das contradições entre a aristocracia britânica e a classe trabalhadora começa em 1912 e passa por diversos acontecimentos históricos e mudanças que envolvem o Reino Unido. No centro da trama, está a família Crawley, aristocratas afetados pela ameaça da chegada de um novo herdeiro e por conta da conquista de espaço dos mais humildes. Para viverem em um mesmo novo mundo, nobres e empregados precisam construir relações diferentes e lidar com uma realidade bem menos glamourosa.
7) The Good Wife (CBS)
Depois de ver o marido preso por um escândalo de corrupção, Alicia Florrick precisa abandonar a rotina de esposa e mãe para retomar a carreira de advogada. Nessa trajetória, a personagem aprende a deixar a passividade de lado para controlar a própria vida, driblando machismo, preconceito e as traições de uma carreira competitiva. Protagonizada pela ótima Julianna Margulies, "The Good Wife" expandiu o conceito de série jurídica e apostou em histórias mais robustas, além de criar personagens muito interessantes e, algumas vezes, excêntricos. A produção ainda rendeu um spin-off igualmente bem-sucedido, que deixa a expectativa se Alicia pode reaparecer em um novo momento da vida.
6) The Crown (Netflix)
O que há por trás da aparência da realeza britânica? Em três temporadas, "The Crown" mostrou, até aqui, os bastidores dos primeiros 25 anos de reinado de Elizabeth II, a monarca do Reino Unido. Com apuro estético e histórico, a série é focada nos conflitos criados entre os deveres das funções e o lado pessoal dos integrantes da família real, sempre com roteiros que misturam realidade e ficção. Por enquanto, a talentosa Claire Foy e a extraordinária Olivia Colman interpretaram a rainha Elizabeth II na série, que também reserva espaço para outras figuras marcantes, como o primeiro-ministro Winston Churchill. "The Crown", atualmente, é a joia da coroa da Netflix e ainda tem muita história para contar.
5) The Handmaid´s Tale (Hulu)
Em tempos tão estranhos como esse em que estamos vivendo, é assustador que "The Handmaid´s Tale" tenha muito a dialogar com o presente. Baseada no livro homônimo de Margaret Atwood, a série é ambientada em um futuro distópico, onde um grupo com aspirações político-religiosas tomou o poder, nos Estados Unidos, e estabeleceu novas e autoritárias regras, entre elas, obrigar mulheres férteis a serem aias de casais sem filhos e se submeterem a constantes estupros para estancar a queda dos índices de natalidade. Com um texto forte e discussões muito pertinentes, especialmente contra o machismo e sobre a importância da liberdade, "The Handmaid´s Tale" deixa o espectador de boca aberta a cada episódio e com reflexões que podem durar dias.
4) Fargo (FX)
Criada a partir do ótimo filme homônimo, dirigido pelos cineastas Joel e Ethan Coen, "Fargo" expande a história contada no longa-metragem inserindo novos elementos e personagens. Construída em um formato de antologia, cada uma das três temporadas apresenta uma história diferente, sendo que as duas primeiras estão relacionadas, mesmo que por um detalhe. Desenvolvida por Noah Hawley, que acertou na difícil tarefa de explorar o universo dos irmãos Coen, "Fargo" apresenta uma narrativa crescente e um texto acima da média. Mesmo escorregando um pouco no terceiro ano, a série ainda segue superior a muitas outras da década e alimenta a expectativa por uma nova temporada.
3) Dark (Netflix)
Mesclando mistério e ficção científica, "Dark" foi, para mim, uma grata surpresa. Sem dar muita importância a ela e pensando tratar-se de uma história de terror, só descobri recentemente a qualidade e a força hipnótica da produção alemã. Com uma narrativa intensa, que explora as noções de tempo e espaço, a série se desenrola a partir do desaparecimento de um garoto. As buscas mobilizam uma pequena cidade, mas não há qualquer sinal sobre o paradeiro do menino. Logo, o espectador descobre que outros casos semelhantes já ocorreram, mas em diferentes épocas. Mesmo encerrando a segunda temporada de forma óbvia, "Dark" rende uma maratona viciante e ainda deixa o público curioso para a chegada do terceiro e derradeiro ano.
2) Fleabag (BBC)
A frase "rir da desgraça alheia" nunca fez tanto sentido como em "Fleabag", série criada e protagonizada por Phoebe Waller-Bridge. A protagonista, na casa dos 30 e poucos anos, se apresenta como desajustada, cínica e dona de uma rapidez de raciocínio surpreendente. A personagem tem uma vida amorosa instável, enfrenta conflitos familiares e ainda lida com um trauma gerado pela morte de uma amiga, mas também carrega um carisma e um humor que ajudam a superar todos os problemas, ainda que aos trancos e barrancos. E, como se não bastasse, em determinado momento, a protagonista ainda se apaixona pelo padre que vai celebrar o casamento do pai dela. "Fleabag" tem um dos textos mais inteligentes que eu já vi e usa o humor para falar de temas duros, como morte, frustração e outras questões da vida.
1) Breaking Bad (AMC)
Apesar de ter estreado no fim da década passada, "Breaking Bad" terminou em 2013, mas entrou no ranking especialmente pelo fato de ter ficado mais popular depois de entrar para o catálogo da Netflix. Antes disso, a série de Vince Gilligan era apreciada por poucos, que, agora, têm o privilégio de dizer que descobriram logo a genialidade da história de Walter White e Jesse Pinkman. Com episódios perfeito e personagens bem construídos, "Breaking Bad" ainda gera debates sobre a questão central levantada pela trama: ao longo do tempo e das circunstâncias, o ser humano se transforma ou se revela como realmente é? Que série incrível!