FOLHAPRESS
A saída da prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dividiu opiniões no Palácio do Planalto e foi recebida com silêncio pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), que considera o petista seu principal adversário político.
Em Goiânia, onde participava da entrega de ônibus escolares, o presidente não comentou o assunto, se ausentou de entrevista programada e evitou os veículos de imprensa após a expedição da ordem de soltura.
Em caráter reservado, no entanto, disse a um grupo de auxiliares e aliados que a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), que barrou a prisão após segunda instância e permitiu a soltura do petista, deve ser respeitada.
Durante a cerimônia na capital goiana, minutos depois da decisão do juiz federal Danilo Pereira Junior, um assessor do Palácio do Planalto se dirigiu à tribuna de honra e mostrou ao presidente a tela de seu celular.
Bolsonaro ouviu em silêncio e, menos de um minuto depois, cochichou ao ouvido do ministro da Educação, Abraham Weintraub, que estava sentado ao seu lado. Após a conversa, olhou para a frente e baixou a cabeça.
Próximo a discursar, o presidente falou sobre diversos assuntos, como a necessidade de não ter o que chamou de "ideologia política ou de gênero" no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), mas não abordou a soltura de Lula.
Na sequência, deixou o local sem comparecer a entrevista programada.
A saída do presidente surpreendeu até mesmo a sua equipe de comunicação. Minutos antes de Bolsonaro entrar no carro, dois assessores palacianos já tinham organizado o espaço e anunciado que os jornalistas teriam direito a três perguntas.
Ao serem informados de que Bolsonaro havia desistido, os repórteres saíram às pressas do local, pegando mochilas e equipamentos. Um deles chegou a pular um balcão para alcançar a comitiva presidencial.
O presidente viajou a Goiânia para cerimônia de entrega de 214 ônibus escolares do programa Caminho da Escola. Por coincidência, a iniciativa federal foi lançada quando Lula estava à frente do Palácio do Planalto, em 2007.
Após a solenidade, Bolsonaro compareceu à inauguração do escritório político regional do líder do governo na Câmara dos Deputados, Major Vitor Hugo (PSL-GO). A assessoria do parlamentar havia informado que estava programada uma entrevista.
Segundo relatos feitos à reportagem, no entanto, a pedido da segurança presidencial, a entrada da imprensa foi proibida e um forte esquema de segurança foi montado ao redor da casa.
Na entrada, antes da chegada dos jornalistas, ele cumprimentou simpatizantes que o esperavam do lado de fora. Na saída, em comportamento atípico, não se dirigiu aos moradores da região, fazendo apenas um aceno de longe.
Se a soltura de Lula teve como resultado o silêncio de Bolsonaro, no Palácio do Planalto as reações se dividiram entre otimismo e pessimismo.
Para integrantes do núcleo ideológico, formado por seguidores do escritor Olavo de Carvalho, a soltura do petista retoma a polarização da campanha eleitoral, entre direita e esquerda, o que pode fortalecer o apoio ao presidente contra uma volta do PT ao governo federal.
A avaliação desse grupo governista é a de que, no momento em que a rejeição de Bolsonaro apresenta um crescimento, como mostram as pesquisas de popularidade, o ressurgimento de um antagonista de peso pode ajudar a paralisar a alta entre eleitores de centro, em virtude do receio de uma eventual candidatura presidencial de Lula em 2022.
O chamado núcleo moderado, formado pela cúpula militar e pela equipe econômica, no entanto, não é tão otimista.
Para esse grupo, a volta de Lula ao cenário político cria o risco de uma reorganização da oposição, que até então, na avaliação desses integrantes do governo, tem apresentado uma atuação tímida.
O receio é o de que esse novo cenário crie uma onda de manifestações no país, que pode fragilizar a imagem do governo e estimular retaliações no Congresso Nacional, como a obstrução de votações de interesse do Planalto.
A decisão da STF de barrar a prisão em segunda instância surpreendeu o núcleo mais próximo de Bolsonaro, que não esperava que o ministro Dias Toffoli, presidente da corte, desempatasse a votação contra a prisão imediata.
Nos últimos meses, Toffoli vinha dando sinais de que buscava uma aproximação com Bolsonaro. Ele, inclusive, evitou comentar a declaração do filho do presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), de que, se a esquerda radicalizasse no país, poderia ser editado um novo AI-5.
Segundo relatos feitos à reportagem, Bolsonaro dizia acreditar que Toffoli se posicionaria de modo diferente.