24 de Abril de 2024
Informação e Credibilidade para Sorocaba e Região.

"Parasita" rompe barreira do idioma e faz história no Oscar

Divulgação
Postado em: 10/02/2020

Compartilhe esta notícia:

Erick Rodrigues

Quando venceu o Globo de Ouro, lá no início de janeiro, o diretor sul-coreano Bong Joon-ho tinha uma mensagem muito clara à indústria do cinema norte-americana. Na ocasião, sugeriu que o público e os especialistas do país deveriam superar a barreira do idioma para conhecerem outros universos incríveis. A fala, com uma crítica embutida nela, não foi apenas parte de um discurso. Os norte-americanos, de uma forma geral, não são simpáticos aos filmes com legenda e, apesar de exportarem e até imporem a língua inglesa para o resto do mundo, sempre se mostraram reticentes diante de obras cinematográficas de outros países.

A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood foi criada para a valorização da cultura norte-americana e se transformou em uma forma de retratar e difundir hábitos da nação. Com o passar dos anos, o Oscar foi se tornando um clube restrito, marcado por muita tradição e discussões políticas. O bairrismo sempre predominou, ainda que, de vez em quando, forasteiros fossem chamados para as festas.

Não é de hoje que Hollywood identifica o talento e a diversidade das histórias contadas pelo cinema de outras partes do mundo, mas, até então, a atitude da indústria era tentar se apropriar dessas ideias para transformá-las em produtos "genuínos", forjados pela "genialidade" norte-americana. Diante de tudo isso, a vitória de "Parasita" no Oscar 2020 tem muito mais significado.

O longa da Coreia do Sul foi conquistando público e crítica desde o ano passado, mas muitos acreditavam que a visão tradicional da Academia predominaria quando chegasse o Oscar. Nesse cenário, "1917", filme do diretor Sam Mendes, parecia se credenciar como favorito. Além de ter uma proposta técnica arrojada e contar com um tema muito bem quisto por Hollywood, a guerra, a produção também venceu alguns troféus que servem de "termômetro" para a cerimônia, como o Producers Guild Awards. Mas, "Parasita" foi ganhando espaço em um ambiente mais favorável à diversidade.

Há alguns anos, a Academia foi muito cobrada para que se abrisse às diferenças. Isso gerou um movimento, com tom político no início, de convidar profissionais de outros países e com visões diferentes sobre a indústria para serem membros. Esses novos olhares foram, de forma gradual, tentando impor algumas mudanças no prêmio e a vitória de "Parasita" é, por enquanto, a mais significativa delas.

Além do Oscar de melhor filme, a obra de Bong Joon-ho também levou outros três prêmios importantes da cerimônia: direção, filme internacional e roteiro original. Em uma das vezes que subiu ao palco para agradecer, Joon-ho falou sobre as influências como cineasta e citou Martin Scorsese, ícone da indústria que concorria na mesma categoria por "O Irlandês". Foi um belo reconhecimento de um profissional que, durante a carreira, foi influenciado por pessoas e elementos de Hollywood. Como ele, muitos outros criaram repertório e alimentaram o sonho de fazer cinema consumindo produtos norte-americanos e estava na hora da Academia reconhecer o talento deles, representados pela figura do sul-coreano.

É claro que as circunstâncias não podem ser apontadas como únicas responsáveis pela vitória de "Parasita" no Oscar. O filme é uma obra refinada que, além de entretenimento, também proporciona reflexões importantes para o mundo. O longa olha para o abismo criado para a desigualdade social, que produz conflitos e injustiças em vários idiomas.

Misturando diferentes gêneros, "Parasita" constrói uma narrativa surpreendente, em três atos bem definidos. Primeiro, em um tom satírico, o roteiro mostra como a família Kim, que vive em dificuldades financeiras, usa todas as práticas possíveis para se inserir no universo dos Park, que moram em uma área nobre e têm uma vida privilegiada.

A história ganha densidade quando os Kim começam a descobrir segredos por trás das aparências da casa luxuosa dos Park. No terceiro e último ato do filme, o abismo entre esses universos se transforma em uma "panela de pressão", que explode na cara do espectador e deixa a reflexão sobre a indiferença diária que temos em relação a realidades distintas.

Pouco sutil, o roteiro de "Parasita" aposta em muitas situações que parecem absurdas para tornar bastante evidente as diferenças e o choque entre os estilos de vida. Com inteligência, o diretor usa até a ambientação da história para provocar reflexões. Assim como nosso dia a dia, a geografia do filme é importante para entendermos a desigualdade social do mundo, onde os ricos vivem acastelados e distantes das dificuldades dos mais pobres.

"Parasita" conseguiu romper a barreira do idioma e teve a excelência reconhecida por Hollywood, caminho construído, é importante reconhecer, por milhares de produções e profissionais estrangeiros que tentaram o mesmo. As qualidades da produção de Bong Joon-ho encontraram pela frente um cenário mais favorável para a produção de filmes internacionais na Academia, com a chegada de novos votantes e as exigências por diversidade. Não se enganem, no entanto, que essas sejam as únicas justificativas para a vitória sul-coreana. Essa também foi uma decisão política, diante da perda de público e até de relevância do prêmio. Fazendo isso, a Academia sinaliza que está disposta a mudar para permanecer influente e precisa continuar assim. Saberemos daqui para frente se a "bolha" da indústria cinematográfica norte-americana foi rompida de vez ou se só deu um "gostinho" de diversidade a um público ávido por mais criatividade.

Compartilhe:

NOTÍCIAS RELACIONADAS

STF deve julgar dia 25 suspeição de Moro pedida pela defesa de Lula

Polícia Civil prende homem por tráfico de drogas em Araçariguama

Outono chega com temperaturas acima da média em todas as regiões

Decisão de Kassio sobre cultos incomoda ministros do STF, que preveem reversão em plenário

Justiça Eleitoral confirma Rodrigo Manga como candidato a prefeito de Sorocaba

Sorocaba está entre as cidades com menor isolamento social na região