A vereadora Iara Bernardi (PT) publicou em suas redes sociais sua estranheza e críticas ao analisar as apostilas do sistema SESI de ensino, que o prefeito José Crespo (DEM) está implantando no sistema municipal de educação de Sorocaba. Em um comentário na própria postagem, a vereadora, em tom irônico, aconselhou os educadores da rede municipal a “trabalhar direitinho com as crianças de 5 anos as noções básicas de Machismo e Racismo das apostilas do SESI. O tio Crespo e o tio André vão tomar a lição depois”.
Nesta segunda-feira (4), finalmente os educadores da rede municipal foram apresentados ao novo sistema de ensino, que passa a ser aplicado nesta terça-feira (5) nas escolas da cidade, que voltam ao ano letivo. Cerca de 2600 educadores receberam um treinamento acerca do novo material. Muitos deles vestiram preto, como o Ipa Online destacou na manhã desta segunda-feira, para demonstrar a insatisfação com a qual recebem o apostilamento. Segundo eles, a decisão de Crespo em implementar o material não estabeleceu diálogo com os servidores. Foram investidos cerca de R$ 8 milhões de reais nas apostilas.
“Neste sábado e domingo tive o tempo e oportunidade de conhecer parte das apostilas do SESI, desconhecidas pela Rede, que não teve a oportunidade nem o canal de diálogo para opinar sobre elas. O que vi suscita muitas perguntas de difícil resposta, a indica graves dificuldades pela frente”, disse a vereadora Iara Bernardi.
Segundo a Secretaria da Educação (Sedu), adotar o sistema promoverá um alinhamento pedagógico que atualmente não existe com os títulos do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Até 2018, cada unidade escolhia os livros com os quais trabalharia durante o ano. O secretário André Gomes, em material divulgado pela Prefeitura, afirma que isso prejudica os alunos que mudam de escola ao longo do ano letivo. “Durante a transferência escolar, um estudante transferido de uma escola para outra perde a sequência do material utilizado. Com o Sistema Sesi, os livros didáticos estarão alinhados em todas as unidades, trazendo equidade às nossas crianças”, explica o secretário.
Ainda segundo a Prefeitura, outro motivo para a adoção do Sistema de Ensino do Sesi é o fato de atender 14 mil alunos de Pré 1 e Pré 2, turmas que o PNLD não atendia. Além dos livros, segundo a Sedu, o sistema ainda conta com formação continuada, presencial, para todos os diretores, vice-diretores, orientadores pedagógicos e professores. Também conta com um processo de monitoramento, acompanhamento e avaliação do ensino-aprendizagem, além de um canal online para esclarecer dúvidas dos docentes em tempo real.
Falta de estrutura
Segundo a vereadora Iara Bernardi, mesmo apresentando bons textos, as apostilas pedem sempre após as aulas pesquisas na internet. “Pergunto, haverá tempo para isso se não temos mais o período integral? As escolas têm computadores para todas as salas fazerem consulta? Todas as escolas têm bibliotecas para consulta? Isto é pedido sempre após o estudo da apostila”, afirmou.
Questões regionais aparecem, segundo ela, com frequência nas apostilas, dificultando o cumprimento das atividades propostas. Em vários materiais aparecem textos que são para alunos paulistanos, com paisagens da cidade de São Paulo, mapas, metrô, parques, avenidas, bairros da capital, shoppings, USP, sugerindo atividades e visitas. Para a vereadora, haverá uma grande dificuldade para os professores adequarem as atividades sugeridas à realidade sorocabana.
“Para todas as apostilas, em cada tema temos várias indicações de livros e vídeos para a leitura e aprofundamento do assunto. Temos esses livros escolhidos nas nossas bibliotecas para os alunos?”, pergunta. “Sempre que os textos pedem reflexão sobre a sua cidade a apostila se refere à capital. Como trabalhar este problema? Ignora-se estes textos?”, conclui.
Denúncia de racismo e sexismo
Uma imagem do material didático gerou polêmica no fim de semana. A vereadora Iara Bernardi divulgou em suas redes uma foto de atividade destinada a crianças de 5 anos. Na foto, aparece a ilustração de uma moça negra com as pernas cruzadas, sobre a legenda “perna”, acompanhada de uma cabeça masculina, sobre a legenda “pescoço”, e do desenho de um pernilongo, sobre a legenda “pernilongo”. Aos alunos, é questionado: “O que é, o que é que vira a cabeça do homem?”.
A foto também foi compartilhada pela União dos Negros pela Igualdade (Unegro), que publicou uma nota tecendo críticas ao que classificou como “conteúdo racista e sexista do novo material adquirido pela prefeitura a ser distribuído para as escolas da rede municipal”.
Leia a íntegra da Nota da Unegro:
O ensino público e de qualidade é um dos pilares para a construção de uma sociedade que consiga fornecer conhecimento e potencial de reflexão aos cidadãos, sendo uma das bandeiras mais importantes dos movimentos sociais dos últimos anos.
A imagem de um povo se constrói através da sua história, isso significa dizer que o sentido de pertencimento se compõe através das informações que se tem ao longo da vida’ sobre a origem desse povo, suas conquistas e principalmente sua colaboração com a formação da sociedade.
Constituir outro olhar sobre a história da humanidade e a história do Brasil, significa uma perspectiva menos eurocêntrica de pensamento e, a ampliação do aprendizado sobre os processos históricos que compuseram, envolveram e desenvolveram a sociedade brasileira. Sendo impossível contar essa história sem falarmos daqueles que vieram de África.
A negação da história africana nos currículos escolares no Brasil, acabaram por colocar a população negra na sua atual situação, a reivindicação por parte do movimento negro do ensino da História da África e da Cultura Afro Brasileira está no centro das discussões para a erradicação do racismo da sociedade brasileira.
O movimento negro do município de Sorocaba alcançou duas vitórias significativas junto aos órgãos municipais de ensino. Primeiro quando o Conselho Municipal de Educação de Sorocaba delibera a atualização e acompanhamento da implementação dos Artigos 26A e 79B da Lei Nº 9394 de 20 de Dezembro de 1996 ( Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), que inclui obrigatoriamente o ensino da História da África e Afro Brasileira e dos Povos Indígenas em seus currículos; segundo na realização do I Fórum de Educação para ás Relações Étnico Raciais.
Dentro dessa trajetória de conquistas no âmbito da educação escolar municipal percebemos a disposição da administração municipal na mudança dos paradigmas de ensino e aprendizagem na elaboração e construção de currículos com bases mais abrangentes de informação e conhecimento tanto na formação dos professores da rede municipal, quanto para os alunos.
Diante do exposto foi com surpresa e extrema preocupação que recebemos na última sexta feira (01/02/19) uma denúncia sobre o conteúdo racista e sexista do novo material adquirido pela prefeitura à ser distribuído para as escolas da rede municipal, o sistema de apostilamento do Sesi.
Em que pese o valor do material, a polemica gerada na cidade, a liminar de proibição, o programa nacional do livro didático, do Ministério da Educação, que era usado na cidade, o teor racista e sexista do material nos leva a rediscutir o compromisso da administração pública municipal na pasta da Educação.
A UNEGRO como uma entidade do movimento negro da cidade, questiona a Secretaria da Educação e sua gestão sobre conteúdo apresentado no material que já foi distribuído nas escolas da rede municipal, por que ele apresenta um prejuízo concreto na formação da identidade das crianças negras, principalmente das meninas negras, porque reforça o estereótipo da objetificação da mulher negra.
Acreditamos que para ter no futuro uma sociedade mais consciente e absolutamente livre de preconceitos, urge começar pela educação em todos os níveis do ensino, e é de responsabilidade da administração publica zelar pelo cumprimento desse dispositivo constitucional.
Direção Municipal da Unegro