Tereza Maria Dal Picolo, que expressou opinião em minha postagem sobre o candidato a governador João Dória Jr. ter dito que as Santas Casas enfrentam problema por falta de gestão e não de dinheiro, afirma que a Prefeitura de Sorocaba repassa por mês R$ 8 milhões à Santa Casa.
Ela dá a entender que a Santa Casa de Sorocaba reclama de barriga cheia, portanto. Porém, esse valor (R$ 8 milhões) divulgado por ela – numa troca de mensagens com a vereadora Iara Bernardi – é mentiroso, assim como é mentirosa a afirmação dela de que a Santa casa nãp atende pelo SUS Sistema Único de Saúde). E por isso, conversei com o padre Flávio Miguel, diretor da Irmandade Santa Casa de Sorocaba, a respeito do custo mensal e o que ele envolve. Assim, entendo, o sorocabano também vai entender se é possível fazer gestão sem dinheiro, como sugeriu o candidato tucano.
Antes que venham com esse argumento, já digo: Pouco importa se Tereza Maria Dal Picolo é um avatar ou um robô ou seja ela mesma (em seu perfil no Facebook ela diz ter trabalhado em dois hospitais, um escritório de advocacia e numa imobiliária, todos bastantes conhecidos em Sorocaba). Há na opinião dela um pensamento e é esse pensamento que pretendo debater aqui com os leitores.
Blog – Qual o custo da Santa Casa hoje?
Padre Flávio – Recebemos R$ 6.95 milhões da prefeitura (deste valor um pouco mais de 4 milhões é diretamente da Sorocaba e outros 2,5 milhões vêm da prefeitura através de repasses do governo federal). Além disso, recebemos R$ 640mil/mês do governo do Estado (Pró-Santa Casa e o Santa Casa Sustentável). Para a Radioterapia receberemos R$ 210 mil/mês aproximadamente para fazer um pouco mais de 100 procedimentos. Enfim, hoje a Santa Casa não aguenta com esses repasses. Segundo minha equipe de administração financeira, o Hospital para se manter precisaria hoje de R$8,6 milhões aproximadamente. Sem isso ele vai quebrar ou teremos que cortar serviços.
Blog – O Hospital do Câncer de Barretos revelou que cobre 60% de seu custo mensal com filantropia. Aqui é qual percentual?
Padre Flávio – Hoje a Santa Cada é 100% SUS (Sistema Único de Saúde), ou seja, filantrópica. Mmas teremos que privatizar com o tempo 40%. Essa decisão não é feita hoje porque mataria de vez a população. Lembrando que ela é filantrópica, ou seja, o lucro da terceirização seria para o próprio povo. A Santa Casa e nenhum hospital filantrópico aguenta mais ser 100% SUS.
Blog – E as emendas parlamentares?
Padre Flávio –Existem 3 tipos: as emendas de custeio (compra de remédios, por exemplo); as de aquisição de aparelhos hospitalares; e, por fim, a de construção. Os valores totais vão depender das finalizações que estão em curso. Por exemplo, com o presidente Temer consegui R$ 2 milhões para compra de aparelhos hospitalares (maioria para o Centro cirúrgico que está sucateado) . O Ministério fez a visita e viu o caos aqui e “fui chorando” e consegui mais de R$ 3 milhões (chegarão após as eleições, já é verba carimbada.
O que é uma Santa Casa
Em seguida, o Padre Flavio explica a natureza jurídica das Santas Casas como instituições do Terceiro Setor. No Brasil e no mundo, as instituições são divididas em três setores: Primeiro setor; Segundo setor; Terceiro setor.
O Primeiro Setor concerne ao Estado: nele, encontramos todas as instituições sob administração dos governos municipais, estaduais ou federais, que oferecem bens e serviços públicos, como ministérios e universidades, por exemplo.
Já Segundo Setor abrange a iniciativa privada, isto é, a oferta de bens e serviços com fins lucrativos.
Finalmente, o Terceiro Setor é uma combinação dos outros dois e consiste em um conjunto diversificado de instituições e organizações privadas que atuam em prol do bem comum e da cidadania, sem fins lucrativos.
A primeira instituição a fazer parte do terceiro setor, no Brasil, foram as Santas Casas, porque configuram as principais referências históricas do desenvolvimento do terceiro setor no país, oferecendo, até hoje, apoio assistencial e hospitalar em diversos estados. Além disso, historicamente, o terceiro setor foi o primeiro a surgir, tomando forma — a exemplo das Santas Casas — de iniciativas complementares aos objetivos do Estado, oferecendo serviços que visavam melhorar a qualidade de vida da população, mas que não são geridas pelo governo, tampouco tem fins lucrativos.
Juridicamente, as entidades sem fins lucrativos serão sempre constituídas como Associação ou Fundação:
Associação é um Entidade de direito privado, constituída de um grupo de pessoas que se organizam para fins não-econômicos, não havendo, portanto, distribuição de lucros entre seus participantes. São constituídas através de um Estatuto Social e normalmente atuam nas áreas de assistência social, ambiental, da saúde ou da educação;
Fundação é entidade de direito privado, constituída através de bens ou direitos, com personalidade jurídica e voltada para fins filantrópicos. As fundações são acompanhadas pelo Ministério Público.
As Santa Casa são de direito privado mas também são filantrópicas. Mas o que é Filantropia?
A origem etimológica da palavra filantropia significa “amizade pela humanidade”. O conceito original, desenvolvido no início do século passado, parte do princípio de que a ação social nasce, fundamentalmente, da decisão individual de um possuidor de bens ou recursos financeiros, que acredita que esses recursos doados a uma entidade ou a uma causa podem fazer a diferença na vida de uma pessoa. Outra abordagem para a filantropia é quando ela atua como um segmento da sociedade civil que busca construir um sistema alternativo da situação de exclusão do ser humano. Essa abordagem utiliza o recurso privado para o beneficio público, buscando transformar a sociedade, a partir de programas e projetos criativos, testes modelos que tornam serviços e bens mais acessíveis, construção de relações entre diferentes setores e grupos sociais, geração de capital humano e social, influência em políticas públicas.
Um hospital filantrópico é público?
Não. Essas instituições são privadas, sem fins lucrativos, mas são contratadas pelos gestores públicos, através de convênios, para prestarem serviço ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Os hospitais filantrópicos atendem planos de saúde ou particular?
Grande parte dos hospitais filantrópicos atende tanto pelo SUS (60%)como também presta serviço aos pacientes de forma particular (40%) . Algumas instituições possuem inclusive planos de saúde próprios.
Por que os hospitais filantrópicos têm déficit financeiro?
As principais dificuldades enfrentadas pelos hospitais devem-se à baixa remuneração praticada pela tabela do SUS e a falta de recursos que deveriam ser investidos diretamente pelo poder público. O segmento ainda enfrenta constantes atrasos no repasse da remuneração pelos serviços prestados.
Como não visam lucram, mesmo sendo privadas, as Santas Casa podem receber dinheiro público para agregar o seu patrimônio através de verbas municipais, estaduais e federais, já que mesmo na parte privatizada o “lucro” oriundo, é revertido para sua missão filantrópica e assistencial.
Por fim cada Santa Casa tem sua filosofia presente em seu Estatuto Social. No Brasil historicamente as Santas Casas foram ligadas à Igreja Católica desde o seu nascimento e portanto possuem sua filosofia própria de cuidado aos mais pobres e doentes, a luz da fé e moral da Igreja. No entanto, se forem administradas no seu Estatuto Social por outra instituição religiosa ou não, também terão sua própria filosofia a ser respeitada no serviço social.