Artur Rodrigues e Carolina Linhares, FOLHAPRESS
A cratera aberta no asfalto da marginal Tietê, na zona norte de São Paulo, ao lado de obra da linha 6-Laranja do Metrô, virou arma contra as campanhas do governador João Doria (PSDB) ao Palácio do Planalto e de Rodrigo Garcia (PSDB) ao Palácio dos Bandeirantes.
O tamanho do estrago político, no entanto, ainda é incerto.
A linha para ligar a Brasilândia (zona norte) à Liberdade (centro) foi retomada por Doria após quatro anos de paralisação. Trata-se de uma das principais apostas de vitrines eleitorais do tucano, que foi estilhaçada na manhã desta terça-feira (1º).
A obra é de responsabilidade da Linha Uni e da Acciona, que afirmaram estar apurando os fatos. Há interdições no sentido Ayrton Senna da marginal –não se sabe até quando o bloqueio vai durar e o impacto que haverá no cronograma das obras da linha, até então prevista para 2025.
Para opositores de Doria, o evento pode tanto ser apenas um abalo temporário como um terremoto na campanha do tucano. Tudo depende dos desdobramentos do acidente, como, por exemplo, o tempo de interdição da marginal Tietê e o tamanho do estrago na obra do metrô.
Em suas redes sociais, Doria afirmou ter determinado a "apuração imediata das causas e elaboração de plano da concessionária responsável pela obra, junto à prefeitura da capital, para normalização do tráfego da marginal rapidamente".
"E que as obras possam ser reiniciadas, com segurança, o mais breve possível", escreveu.
O secretário dos Transportes Metropolitanos, Paulo Galli, apontou o rompimento de uma galeria de esgoto como o motivo do alagamento.
"A obra vinha normalmente. Estamos na embocadura da toneladora para esse poço. Seria rompido amanhã [quarta-feira], quando teríamos o tatuzão passando pelo túnel. Daí, houve o rompimento da galeria de esgoto que passa no sentido transversal", afirmou nesta terça.
O assunto já é alvo de investigação. A Promotoria de Habitação e Urbanismo da Capital abriu um inquérito para apurar as causas e "a extensão dos danos urbanísticos e ambientais decorrentes do incidente que causou danos no canteiro de obras e na pista de rolamento da marginal".
O Ministério Público informou que já requisitou informações sobre o caso.
Entre integrantes do núcleo duro da campanha de Doria, o desabamento foi minimizado, embora secretários consultados pela reportagem ainda avaliassem, na tarde desta terça, os danos práticos e políticos para a gestão.
A essa altura, porém, o assunto já havia virado munição política de inimigos políticos de Doria, da esquerda à direita.
A deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e o deputado estadual bolsonarista Douglas Garcia (PTB-SP) coincidiram até no termo usado para criticar o governador, mirando o partido.
"Fundamental apuração imediata. Por sorte, não há registro de vítimas. Selo PSDB de gestão!", escreveu Sâmia em suas redes.
"Selo PSDB de qualidade: obras desabando na marginal Tietê! Ano passado a Alesp autorizou João Doria a contratar um empréstimo bilionário para melhorias no metrô. Meu voto foi não, por saber que este dinheiro seria mal gasto", postou o deputado.
O vereador Rubinho Nunes (Podemos), membro do MBL (Movimento Brasil Livre), relacionou a pretensão eleitoral do governador com o acidente.
"O oportunismo do Doria não tem limites. A obra estava há quase 10 anos atrasada, mas chegou o ano eleitoral, e o governador quis retomá-la às pressas. O resultado? Desabamento e cratera na marginal Tietê", afirmou nas redes.
Se depender da oposição, os desdobramentos do caso não devem acabar tão cedo. O PT pediu responsabilização do governo Doria.
O deputado estadual Paulo Fiorilo (PT) afirmou à reportagem que fez uma representação ao Ministério Público para investigar o caso. "São recorrentes problemas desse tipo nas obras do Metrô. É preciso que o MP instaure o inquérito para apurar", disse.
De acordo com ele, o assunto também poderia ser tratado em uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). A ideia é que, caso a Justiça dê seguimento à comissão da Dersa, que foi travada na Alesp por aliados de Doria, o assunto pode virar alvo de investigação dos deputados.
Um dos principais opositores de Doria, Márcio França (PSB), possível concorrente de Rodrigo Garcia na disputa ao governo, também foi as redes e classificou o caso como "incompetência inacreditável".
Para o cientista político Marco Antonio Teixeira, da FGV, embora vários estados estejam sofrendo por tragédias causadas pelas chuvas, no caso do acidente do metrô pode haver questionamentos mais duradouros em relação à eficácia da gestão.
Teixeira afirma que o assunto remonta ao buraco do metrô, em Pinheiros, no qual sete pessoas morreram soterradas e mais de 70 casas foram interditadas. "Você vai ter a coisa do trânsito, lembrando não apenas do problema todo dia, mas questionando a eficiência da gestão da obra", diz.
O assunto também pode esvaziar um trunfo de Doria para a campanha de Garcia, sobretudo contra o hoje inimigo político Geraldo Alckmin (sem partido), cuja gestão como governador de São Paulo foi marcada por atrasos em obras do metrô.
Auxiliares de Doria ligados à comunicação da campanha avaliam que não haverá prejuízo eleitoral e destacam haver mais de 8.000 obras em andamento pelo estado –ainda que o metrô seja uma área politicamente sensível para os tucanos.
Os aliados do governador atribuem a cratera a uma falha técnica de engenharia e apostam que o problema será resolvido rapidamente, o que só serviria para comprovar a capacidade de Doria como gestor.
Também lembram que o PSDB não deixou de eleger governadores em São Paulo após o acidente da linha 4-amarela, em 2007.
Ainda de acordo com tucanos, a crise não atinge a candidatura de Garcia ao Palácio dos Bandeirantes. O vice-governador, que tem viajado pelo estado para inaugurações, foi poupado nesta terça, enquanto Doria visitou o local do desastre.
A obra é de responsabilidade da Linha Uni e da Acciona, que afirmam que estão no local dos fatos para apurar o que aconteceu. "Todas as medidas de contingência já foram tomadas. Parte do asfalto da marginal Tietê cedeu e, por questão de segurança, a pista está parcialmente interditada", disse, em nota.
As críticas a Doria são atribuídas por sua equipe a bolsonaristas. A hashtag "Doria chama o Tarcísio", em referência ao ministro da Infraestrutura, Tarcisio de Freitas, que deve concorrer ao Governo de São Paulo, ficou entre as mais comentadas no Twitter, além das palavras "Tietê", "metrô" e "PSDB".
A presença de Doria na estação atingida pouco tempo depois do desabamento também é uma forma de se contrapor a Bolsonaro, que foi criticado pela omissão em outras tragédias, como as chuvas na Bahia no fim do ano passado.
Nesta terça, o presidente esteve em São Paulo, sobrevoando áreas afetadas pelas chuvas no estado de São Paulo.