Ricardo Della Coletta, Folhapress
Em uma série de novos ataques contra o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), incluindo alegações já desmentidas, o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), acusou nesta segunda-feira (2) o presidente da corte, ministro Luís Roberto Barroso, de querer uma eleição "suja" no ano que vem.
"Quem quer eleição suja e não democrática é o ministro Barroso. Esse cara se intitula como [quem] não pode ser criticado", declarou, em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada.
A fala foi transmitida pelas redes sociais de Bolsonaro. Na conversa com os simpatizantes, Bolsonaro voltou a alimentar, sem apresentar qualquer evidência, a teoria de que Barroso -que também é ministro do STF- estaria atuando para armar a eleição em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
"O Barroso ajuda a botar o cara [Lula] para fora da cadeia, torna elegível. E o Barroso vai contar os votos dele lá? Qual a consequência disso?". Não existe qualquer indício que corrobore essa acusação.
Bolsonaro também repetiu nesta segunda a alegação de que a contagem dos votos seria feita numa "sala secreta" no TSE, afirmação já desmentida anteriormente pelo tribunal.
A corte eleitoral explicou que a apuração dos resultados é feita automaticamente pela urna após o encerramento da votação. Em seguida, são impressas cinco vias do Boletim de Urna, que traz os votos recebidos por cada candidato naquele terminal. Vias adicionais do boletim são disponibilizadas aos fiscais do partidos.
"O resultado final divulgado pelo TSE sempre correspondeu à soma dos votos de cada um dos boletins de urna impressos em cada seção eleitoral do país", diz o TSE.
O presidente tem promovido uma série de declarações golpistas em defesa do voto impresso, um projeto bolsonarista atualmente em tramitação no Congresso Nacional.
No domingo (1º), ele mais uma vez colocou e dúvida a realização do pleito, ao afirmar: "sem eleições limpas e democráticas, não haverá eleição".
As recorrentes falas do mandatário contra o sistema eleitoral têm elevado a crise entre o Planalto e os demais Poderes, principalmente com o Judiciário.
No Congresso Nacional, uma articulação de legendas atua para derrotar a PEC do voto impresso. Lideranças parlamentares consideram extremamente improvável que a matéria avance a tempo de valer já para a disputa eleitoral de 2022, como quer Bolsonaro.
As falas de Bolsonaro têm gerado apreensão. O receio de críticos é que o mandatário esteja semeando desconfiança sobre contagem de votos no país com o objetivo de ter um argumento para questionar o resultado, numa eventual derrota.
Pesquisas de opinião apontam favoritismo do ex-presidente Lula.
Na mais recente pesquisa Datafolha sobre o cenário do ano que vem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ampliou a vantagem nas intenções de voto e cravou 58% a 31% no segundo turno.
O presidente também atacou Lula na transmissão feita nesta segunda. Ele chamou o petista de "corrupto", "cachaceiro", "picareta" e "incompetente".
A conversa com apoiadores foi recheada de ataques a Barroso, que se converteu no alvo preferencial de Bolsonaro nas últimas semanas.
O presidente disse que Barroso "está abusando não é de hoje" e o acusou de defender o aborto e a liberação de drogas". "Ele [Barroso] defende um montão de coisas que não presta."
Pouco depois, em entrevista a uma rádio de Novo Hamburgo (RS), Bolsonaro seguiu disparando contra o presidente do TSE. "Quem ele [Barroso] pensa que é para dizer que a vontade dele tem que ser aquela que vale no Brasil? Ele virou semideus, acha que é intocável? É o dono da verdade?", disse o presidente.
"[O] Barroso quer as eleições que possam ser manipuladas ou no mínimo gerar dúvidas no futuro".
Na mesma entrevista, Bolsonaro foi questionado se pretende concorrer à reeleição mesmo com o sistema de votação eletrônico, em vigor atualmente. O mandatário se esquivou de dar uma resposta conclusiva. "A gente não pode disputar umas eleições, perder e reclamar depois. Suponha que seja mantido o atual sistema que está aí; suponha que eu concorra e perca, mesmo com vários indícios de fraude, como tivemos em 2018 entre outras eleições. No fina da linha, quem vai julgar meu recurso? O STF. Preciso te responder alguma coisa?", afirmou Bolsonaro.
Depois de uma frustrada tentativa de entrar no Patriota, o presidente disse ainda nesta segunda estar conversando com outros partidos, entre eles o PP, sobre sua possível filiação. Declarou que nas conversas partidárias tem manifestado interesse em que a legenda escolhida lhe garanta candidatos aliados em dois colégios eleitorais importantes: São Paulo e Rio de Janeiro.
"[Eu] gostaria de ter a legenda para governador de São Paulo, a legenda para governador do Rio. Uma legenda para uns oito senadores no Brasil", disse. "Se chegar num acordo nesse sentido e for bom para a outra parte -e eu acho que é bom para a outra parte, a gente veio com um capital político muito bom- a gente faz o casamento e a certeza que a gente vai ser feliz por um bom tempo".
Na quinta (29), Bolsonaro promoveu o mais duro ataque contra as urnas eletrônicas, numa live de duas horas também veiculada na rede de televisão pública do governo.
Na ocasião, o presidente trouxe teorias sobre a vulnerabilidade das urnas que circulam há anos na internet e que já foram desmentidas anteriormente. Ele também admitiu não ter provas de suas acusações.
Ainda na entrevista à rádio gaúcha, Bolsonaro baixou o tom em crítica recente feita ao vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB). Em 26 de julho, Bolsonaro disse que Mourão às vezes "atrapalha um pouco".
Nesta segunda, Bolsonaro voltou a comparar seu vice a um cunhado, mas disse que ele "não tem atrapalhado em absolutamente nada". "Ele [Mourão] dá sua opinião, às vezes atropela o governo, mas a gente vai convivendo aqui sem maiores problemas", afirmou Bolsonaro.