Julio Wiziaki e Fábio Pupo, FOLHAPRESS
Os ministérios da Economia e da Infraestrutura fecham os últimos detalhes de um pacote de benefícios para os caminhoneiros que será divulgado por etapas a partir das próximas semanas. Além de um voucher para amenizar efeitos dos reajustes do diesel, o governo estuda linhas de crédito e até um programa de renovação de frota.
Batizado pelos assessores do Palácio do Planalto de "Gigantes do asfalto", o pacotaço foi um pedido expresso do presidente Jair Bolsonaro, que, segundo interlocutores, não quer ficar refém da categoria.
Desde fevereiro, os motoristas sinalizam que os reajustes dos combustíveis afetaram seus ganhos, o que causa temores no governo sobre uma paralisação nos moldes da que ocorreu em 2018. Hoje, 87% do transporte de cargas no país é feito pelas estradas.
Na avaliação de Bolsonaro, um novo movimento grevista poderia comprometer ainda mais a economia, já afetada pelos efeitos da pandemia, além de representar um fator adicional de erosão de sua popularidade –que, segundo pesquisa do Datafolha, tem sido corroída durante a crise do coronavírus.
Diante disso, Bolsonaro encomendou um pacote de ajuda ao setor em reuniões com integrantes de Casa Civil, Economia, Infraestrutura, Justiça e Segurança Pública. Várias ações foram estudadas, com pedido para não haver mais gastos.
A engenharia financeira para as medidas passou a ser desenhada enquanto diversos órgãos e iniciativas da União registram falta de recursos, como universidade federais, o Censo Demográfico do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e até o programa de modernização do sistema anticorrupção do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
O programa para os caminhoneiros foi dividido entre medidas econômicas e outras regulatórias, a serem implementadas por meio de MPs (medidas provisórias), decretos e portarias.
Na frente comandada pelo ministro Paulo Guedes (Economia), foi preparado um programa de compensação de preços dos combustíveis. Há duas ideias na mesa, e ainda não se chegou a uma conclusão. Uma delas prevê a criação de um voucher para os motoristas cadastrados para ser usado sempre que houver uma oscilação muito elevada do petróleo –o que afeta o preço do diesel.
Esse voucher funcionaria como um cartão de crédito. Ainda se discute se haveria isenção de impostos federais (PIS e Cofins) ou uma injeção de recursos oriundos de royalties da exploração de petróleo.
O voucher seria operado pela Caixa Econômica Federal, que se prepara para lançar uma cesta de produtos financeiros para os caminhoneiros. Além de crédito com juros mais baixos para os motoristas, o banco deve oferecer empréstimos para donos de postos de gasolina nas estradas que estejam interessados em transformá-los em grandes áreas de descanso e atendimento aos caminhoneiros.
A construção de áreas de descanso é parte de uma obrigação imposta pelo Ministério da Infraestrutura por meio da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) aos vencedores das novas rodadas de concessão de rodovias. Cada empreendedor terá de construir postos com estacionamentos, dormitórios, conexão telefônica e de internet, além de atendimento médico a cada 350 km. Estima-se que serão ao menos 50 postos nesse modelo nas próximas concessões até 2022.
Apesar de ser uma obrigação no edital de concessão, o governo quer estimular a criação de mais centros similares por meio da iniciativa privada, especialmente postos de combustível ou redes de restaurantes de estrada. A Caixa já está se adiantando à medida, de acordo com interlocutores do governo.
O BNDES também deverá ampliar suas linhas de crédito para a compra de equipamentos e manutenção de veículos. Até hoje, foram R$ 500 milhões disponíveis para pedidos de financiamento de até R$ 30 mil, limite que passou para R$ 100 mil.
Também está sendo concluído o programa de renovação de frota. Inicialmente chamado de Frota Verde, deverá ser uma parceria entre União, estados e iniciativa privada para estimular a troca de caminhões.
A idade média da frota dos autônomos, segundo pessoas que participam das discussões, é de cerca de 30 anos. Caminhões muito velhos quebram com mais frequência ao longo do percurso.
Uma das ideias em avaliação será, pelo lado da União, usar recursos disponíveis do Finame (linha do BNDES), dando crédito ao dono do caminhão. O ingresso no programa será voluntário e, após a adesão, o caminhão seria adquirido e destruído.
Para cobrir ao menos parte do programa, a equipe econômica avalia cortar parte dos subsídios do setor automotivo. Os estados também entrariam com sua parte e as montadoras venderiam o caminhão a preço de venda direta, e não pelo valor na concessionária.
A ideia é ter três modalidades: a mudança do caminhão, a compra de um novo ou a reforma –mas, inicialmente, somente a troca deve ser implementada como teste.
Um conjunto de medidas regulatórias completará as ações, sendo a principal a implementação em todo o país da DTE (Declaração de Transporte Eletrônica). Via plataforma digital, será possível solicitar e reunir toda a documentação necessária para o transporte –que hoje demanda tempo e dinheiro para ser obtida.
Pela plataforma, toda a documentação do frete será obtida eletronicamente e o contrato com o dono da carga ficará registrado. Isso permitirá até que o contrato sirva de garantia para que o motorista tome empréstimos.
O caminhoneiro poderá receber o pagamento assim que a carga chegar ao destino. Hoje, precisa voltar ao ponto de origem porque, pelas regras vigentes, é necessária uma espécie de selo de conclusão da viagem concedido ao contratante. Com o novo sistema, o documento poderá ser emitido no ato da entrega.
Na mesma medida, o governo pretende reduzir em 95% o total de multas por excesso de peso nos caminhões. Para isso, vai ampliar o limite de tolerância por eixo.
Além disso, a tabela de frete será ampliada com novas categorias, e a sistemática de cálculo será validada entre as partes tendo como intermediário o STF. A ideia com essa iniciativa é validar a definição de um preço mínimo para o frete e evitar futuras contestações e ações judiciais.
O Ministério da Infraestrutura também conduz um programa de recuperação e modernização das rodovias federais, com R$ 2 bilhões em obras. A pasta também incluiu no edital do 5G obrigações de conexão nas estradas. As operadoras que vencerem o leilão terão de fazer a cobertura de 48 mil quilômetros de estradas federais com sinal 4G.