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Registros de crimes sexuais crescem 265% em transportes públicos de SP

Postado em: 23/03/2019

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Daniel Mariani e Júlia Zaremba, FOLHAPRESS

O número de registros de crimes sexuais ocorridos em metrôs, trens e outros meios de transporte público em São Paulo cresceu 265% em 11 anos, segundo dados da Secretaria da Segurança Pública do estado obtidos pela reportagem por meio da Lei de Acesso à Informação.

Para o levantamento, foram considerados quatro tipos de delitos cometidos de 2008 até o fim de 2018: ato obsceno, estupro, estupro de vulnerável e violação sexual mediante fraude. Ocorreram principalmente em meios de transporte rodoviário (577) e ferroviário (514).

Entre eles, o crime mais frequente no período foi o de ato obsceno, que somou 980 casos. Inclui, por exemplo, ações como exibir ou manipular órgãos genitais em público.

O estupro figura como o segundo crime com mais queixas. Foram 416 registros em dez anos -108 deles só nos últimos dois anos. Consiste no ato de constranger alguém a praticar ato libidinoso mediante violência ou grave ameaça, o que inclui desde agarrar alguém a força até penetração sem consentimento.

Quanto a estupro de vulnerável, definido como a prática de ato libidinoso ou conjunção carnal com menores de 14 anos, foram 225 registros no período. Houve também 106 pessoas que denunciaram violação sexual mediante fraude, quando um agressor engana a vítima para cometer a agressão.

A mudança nas definições de alguns crimes sexuais previstos no Código Penal ocorrida em 2009 ajuda a explicar o aumento nos registros dos crimes, diz Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Pela redação anterior, apenas mulheres poderiam ser consideradas vítimas de estupro -agora não há restrição quanto ao gênero-, e só casos em que houvesse conjunção carnal eram criminalizados. Já o estupro de vulnerável foi tipificado apenas em 2009.

A mudança na percepção das vítimas, principalmente mulheres, sobre a gravidade desses atos de violência também foi um fator importante para o aumento nos números, diz a antropóloga e pesquisadora da USP Beatriz Accioly Lins. “O que antes era visto como uma inconveniência, uma chatice, agora é encarado como uma violação de direitos.”

Apesar do crescimento, a subnotificação ainda é alta. Estudos produzidos pelo Ipea estimam que apenas 10% dos casos de estupro sejam denunciados. “E é um dos mais graves. Imagina outros, classificados como importunação ou ato obsceno?”, diz Bueno.
Medo, vergonha e dificuldades no processo de registro da ocorrência desanimam as vítimas a prestar queixa.

Uma estudante de 22 anos, que não quis ser identificada, viveu um périplo para denunciar um homem que ejaculou em sua perna no início de fevereiro em um trem da linha 9-esmeralda da CPTM. Ela notou que uma pessoa atrás dela mexia bastante as mãos, até que sentiu um líquido em sua calça. Virou-se e viu o homem com o pênis para fora.
“Me senti impotente, fraca. Gritei, mas ninguém me ajudou”, conta. “Percebi o quanto a mulher é inferiorizada. Eu era só uma escandalosa.”

Conteve o homem e, quando as portas abriram, funcionários da CPTM seguraram o agressor. Mas começaram a questioná-la sobre a veracidade da sua versão. “Você viu mesmo isso?” e ” Você tem provas? Ele está dizendo que é chuva” foram algumas das perguntas, segundo ela.

Esperou por cerca de duas horas e meia até ser levada a uma Delegacia da Mulher. Conta que repetiu a história dezenas de vezes. Na polícia, teve que esperar por horas até que o boletim fosse feito -o caso foi registrado como importunação sexual.

A mulher continua andando de transporte público todos os dias. “Mas com muito medo. Até quando vou precisar ter um sensor de homens em volta do meu corpo?”, diz.

Em nota, a CPTM afirmou que a atuação dos funcionários está sendo analisada pelo comitê de ética da empresa e que, após a conclusão das apurações, serão tomadas as medidas cabíveis.

O Metrô de São Paulo afirmou, em nota, que conta com mais de 3.000 agentes treinados para acolher vítimas. Oferece um aplicativo de celular, chamado Metrô Conecta, e um serviço de denúncia por mensagem de texto.

A SPTrans orienta que vítimas procurem imediatamente o motorista e diz que realiza campanhas preventivas para combater o abuso nos coletivos. A empresa afirma que a questão é tratada durante a capacitação dos funcionários.

Já a CPTM afirmou que faz campanhas nas redes sociais e em mensagens sonoras para incentivar denúncia de irregularidades e que mantém uma equipe de segurança que realiza rondas tanto com uniforme quanto à paisana. A companhia oferece ainda um serviço de denúncia por mensagem de texto.

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