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O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, afirmou que o presidente Jair Bolsonaro “deu rédeas” para que a pandemia da Covid-19 fosse politizada no Brasil. “A doença terminou por ser politizada dentro de tudo que está acontecendo no mundo como um todo”, disse em entrevista à Agência EFE publicada nesta sexta-feira (31). Mourão, no entanto, não acredita que Bolsonaro seja responsável pelos números da doença no país.
“Grande parte da mídia diz que ele não tem capacidade nenhuma de liderança, então ele não tem capacidade de fazer com que as pessoas o sigam. Mas, ao mesmo tempo, dizem que ele seria o grande propagador de um certo descaso com a doença”, apontou. "Eu julgo que não. Julgo que a atitude do presidente foi de buscar manter a população não num nível de terror, mas num nível de entender que a doença será grave, que tinha que haver uma proteção, mas não que era o final dos tempos, não era o armagedom que tinha chegado.”
Ainda falando sobre a pandemia, Mourão disse que o presidente deve indicar um ministro da Saúde “definitivo” para o lugar do interino Eduardo Pazuello. Ele reforçou que a Covid-19 deve arrefecer na primavera. “Em relação a quando acontecerá uma queda desse número de mortes, acredito que quando a gente sair do inverno, que é o momento favorável para proliferação de doenças respiratórias. Então os dados que nós temos é que no final de agosto e setembro, que já eram dados levantados desde a gestão do ministro [Henrique] Mandetta”, explicou, dizendo que o “número de óbitos machuca o país como um todo”.
Neste ano, Hamilton Mourão assumiu o Conselho Nacional da Amazônia para melhorar a comunicação do país com fundos internacionais de proteção à floresta. Ele ressaltou que a conversa com dois dos principais investidores, Alemanha e Noruega, foram retomadas e estão andando bem. “Após a criação do Conselho Nacional da Amazônia, nós retomamos as conversas com os representantes dos dois países, reapresentamos o projeto de programa do Fundo [Amazônia], o decreto para a constituição da nova comissão gestora do Fundo. Eles concordaram com isso, mas eles consideram que primeiro precisam ver sinais efetivos de comprometimento com a redução das ilegalidades do desmatamento e queimadas para depois destravarem os recursos que estão à disposição no BNDES“, disse. Segundo o general, o país tem cerca de R$ 3 bilhões disponíveis para serem usados na floresta.
Ele também comentou as ações do governo em relação aos povos indígenas e disse que “não existe nenhuma política negativa em relação aos povos indígenas”. “O Brasil tem em torno de 1 milhão de indígenas, sendo que na Amazônia especificamente vivem 750 mil em áreas que totalizam 1,1 milhão de quilômetros quadrados. É uma área enorme, espalhada, selva na maioria, e aquelas medidas que haviam sido colocadas como obrigação do governo federal eram totalmente inócuas, e o governo é incapaz de realizar além do que já vinha realizando. Uma delas, típica, era a distribuição de água potável nesse 1,1 milhão de km na selva. Como o indígena se abastece da água hoje? Ele se abastece das águas dos rios que banham as terras onde eles habitam. Como é que essa água seria distribuída? Em garrafas pet, para poluir a floresta? Parece que as pessoas não raciocinam na hora e acham que o presidente está negando acesso à água potável aos indígenas. Negativo. O indígena já tem acesso a água, uma água de qualidade a qual o organismo dele está acostumado”, afirmou.
Hamilton Mourão também ressaltou que o mundo está de olho na Amazônia e reconheceu que há problemas na gestão da floresta. “Nós temos que preservar, e muita gente de fora tem uma visão estereotipada sobre o que realmente acontece dentro da Amazônia. Existem ilegalidades, erros cometidos, nós não negamos isso. Houve o avanço do desmatamento, das queimadas, nós temos de lidar constantemente com a questão do garimpo ilegal, mas vamos olhar que 84% da Amazônia é área preservada. Só de área de conservação e terra indígena são 2,2 bilhões de quilômetros quadrados, é metade da área da União Europeia.”
Política e Lava Jato
Ainda na entrevista, o vice-presidente falou sobre as rusgas entre o Executivo e o Judiciário. “A democracia pressupõe harmonia e equilíbrio entre poderes. Harmonia não significa que não haja discussão, é que a discussão fique dentro dos limites dos princípios e valores que norteiam o país, mas leva a discussão. Talvez, em algum momento ou outro, houve alguns excessos verbais – e todos os excessos foram verbais – em relação a essa extrapolação do que vem a ser harmonia. E a questão do equilíbrio, às vezes, na minha visão, ele fica meio torto quando notadamente o poder Judiciário invade, na minha visão, decisões que seriam prerrogativas do Executivo ou do Legislativo”, disse.
“O Judiciário tem que ficar mais afastado de decisões de cunho nitidamente político, como algumas que têm sido tomadas. E em relação aos últimos incidentes, vamos colocar, está muito ligado à liberdade de expressão. Os crimes que porventura uma pessoa que se manifeste pela internet ou pelas redes sociais (cometa) estão muito bem tipificados no nosso código penal, a calúnia, a difamação. Então existem os instrumentos para isso, e você não precisa cercear o direito da pessoa se expressar. Eu acho que a gente passa a entrar em um terreno pantanoso que é o terreno da censura”, continuou.
O general comentou os atos do grupo “300 do Brasil“, liderado por Sara Geromini, e os classificou como “patéticos”. “Você viu aquela cena patética de 20 e poucas pessoas com uma tocha e um manto, ali, num sábado à noite, junto ao STF, sem apoio nenhum, sem nada. Considerar aquilo uma milícia chega a ser… a milícia ela está lá no Rio de Janeiro, tomando conta dos morros. A milícia está em outras grandes cidades no Brasil disputando o narcotráfico com as narcoquadrilhas”, afirmou.
“Aquilo chegou a ser ridículo. Num país sério, vamos colocar assim, em uma análise séria, aquilo era pra rir. Sinceramente, eu vejo dessa forma. E querer transpor aquilo como um grupo de radicais capaz de fazer algum tipo de ação contra uma instituição como o STF, vamos lembrar aqui o seguinte: em 2014, a ‘turma de vermelho’ invadiu o STF, quebrou aquelas vidraças todinhas, ninguém foi preso, quando muito foi autuado e esse assunto foi esquecido.”
Hamilton Mourão também falou sobre as recentes polêmicas envolvendo a Lava Jato e disse que a operação incomodou muita gente. “A Lava Jato é um marco importantíssimo no país, porque ela é um divisor de águas. Até então, o estado de direito efetivo não atingia a turma do colarinho branco. Essa turma continuava solta, e os pequenos ladrões eram presos, os que roubam galinha, os que roubam em supermercados. E os grandes ladrões, aqueles que usam o dinheiro público em proveito próprio, continuavam todos soltos. E a Lava Jato rompeu isso aí, independente de partido político, porque num primeiro momento (dizia-se) ‘atingiu-se o PT’. Não, o PSDB também foi duramente atingido com lideranças que concorreram à presidência da República e são expressiva”, disse.
“Então eu vejo que a Lava Jato incomodou muita gente, porque desnudou essa relação promíscua que havia entre agentes públicos e gestores privados e a malversação dos recursos com milhares de obras inacabadas, com gente que enriqueceu da noite para o dia com contas no exterior. Hoje existe uma ofensiva contra isso e contra seus principais atores, como (o ex-juiz federal e ex-ministro da Justiça) Sergio Moro, como (o procurador Deltan) Dallagnol, (o ex-procurador) Carlos Fernando dos Santos Lima. E eu tenho o maior respeito por esse pessoal, e acho que a sociedade brasileira também. Agora existe uma disputa dentro do próprio Judiciário em torno daquilo que seriam excessos cometidos pela Lava Jato. Ora, se houve excessos, a lei está aí para coibi-los, e o último bastião para definir isso é o nosso Supremo Tribunal Federal (STF), e é ele que tem a última palavra.”